1º Diálogo
Fazer Por Fazer? Melhor Não Fazer!
“ Em vão se eleva o sol para nós, e em vão também ele se põe.
Em vão se estendem seus imutáveis encantos planos e campos,
vales e
montanhas; não são
nada para nós. Muito menos aqui alcança minha
influência, mas hão de preencher-se esses vazios se a
educação
do povo houver de elevar-se da insensatez de sua barbárie
atual
á harmonia com o ser da nossa natureza. ”
Johann Pestalozzi
Questionado sobre qual era o principal
problema dos espetáculos produzidos pelo Teatro
Brasileiro de Expressão Piauiense, respondi evasivamente, que era ausência
de acabamento adequado dos produtos
cênicos apresentados a nossa plateia ainda em formação. Todavia, a resposta
carece de aprofundamento, já que, a falta ou o pouco esmero na finalização dos
espetáculos locais é, apenas, o resultado de uma série de outras lacunas, que
foram decisivas, para as deficiências evidentes do que o espectador acaba consumindo.
O primeiro e, facilmente identificável
ponto nevrálgico, causador de danos incorrigíveis, na quase totalidade dos
espetáculos montados por essas plagas é o despreparo da grande maioria dos
atuantes para realização de obras teatrais autênticas. Atores e atrizes com
pouca ou má formação intelectual, incapazes, muitas vezes, de compreender o
significado do que reproduzem, mecanicamente, em cena. Além disso, o aparelho
psicofísico de enorme parcela dos nossos artistas da cena, não possui condições
mínimas para uma atuação mais exigente, como se não bastasse, esses Núcleos Essenciais do Trabalho Cênico (os
atuantes), são vitimados por duas características internalizadas na nossa
prática teatral: o descompromisso, fruto da
indisciplina, com que encaram aquilo que deveria ser o foco de suas
preocupações; a sua formação profissional, como também, um fator agravante, é a
participação em processos de sistematização e realização de obras teatrais contaminadas por toda sorte de
aberrações, conduzidos, por sua vez, por diretores e encenadores, quando não
incompetentes, absolutamente Ideofrênicos.
Considero Diretores Ideofrênicos, aqueles que operacionalizam seus trabalhos,
valorizando unicamente suas toscas ideias (irrealizáveis ou esdrúxulas) preconcebidas,
somadas a fragmentos metodológicos mal digeridos. Tornou-se lugar comum no
nosso metier, encenadores que autodenominam-se stanislaviskianos, artaudianos, grotowiskianos,
barbianos (sem mencionar os ditos contemporâneos), etc, que nem sequer, leram
as obras desses pensadores do teatro e, quando leram, não as interpretaram
corretamente, geralmente, tiveram contatos superficiais com o conhecimento
produzido por esses mestres através de textos esparsos, catados feito pulgas na
grande rede. Obviamente, tais procedimentos, cedo ou tarde, entrarão
em contradição com a realidade latente de atores e atrizes carentes de melhor
preparação, condições materiais e tecnológicas precárias, baixos ou nenhum
orçamento de produção e conteúdos abordados mal compreendidos ou mal
elaborados. O resultado, quase sempre, são produto culturais de baixa qualidade
técnica, estética e conceitual. Entre os chamados Diretores Ideofrênicos a prática comum, é a alusão, entre os membros
de seu elenco, a elogios feitos as suas obras e realizações por figuras da dita
Classe Teatral (quase sempre hipócritas) ou
a bajulações de membros do público comum, em geral, portadores de um senso
estético, por vezes, bastante adulterado. Dessa forma, institui-se no seio da
nossa nobre arte, verdadeiros pactos de mediocridade, contudo, é importante
salientar; nenhum elogio verdadeiro ou
falso resolverá as deficiências do seu trabalho e nenhuma crítica negativa, ou
até mesmo destrutiva, poderá apagar os méritos dele. Portanto, sem dar
completamente as costas para críticas ou elogios, tendo em vista que essas
categorias fazem parte do universo espetacular, faz-se necessário o
desenvolvimento de uma importante competência no seio das equipes criativas; a autocritica. Esse elemento dentro de
grupos ou coletivos teatrais, torna os Processos
Criativos Clarividentes em contraposição a Processos Criativos Insuficientes, fortalecendo as organizações
teatrais e, evitando, a manipulação do staff por diretores farsantes, geralmente camuflados por uma pseudo
intelectualidade, respostas pré-fabricadas e um arsenal de piadinhas cretinas.
No Piauí, o fenômeno teatral é
realizado em organizações mais ou menos estáveis, o que possibilitaria, pelo
menos em tese, a consecução de projetos de montagem mais completos, no entanto,
isso não notabiliza-se na prática. No microcosmo
teatral, que é o Teatro Brasileiro de
Expressão Piauiense, o que temos reparado são Processos Criativos Insuficientes, caracterizados pela supressão de
algumas fases que, na contemporaneidade, orientam a concepção, condução e
execução das obras artísticas de caráter cênico em grupos, núcleos e coletivos
preocupados na qualificação de seus trabalhos. Localmente, as organizações voltadas
a produção teatral, desenvolvem seus produtos da seguinte forma:
1º Estudo
preliminar realizado pelo diretor.
2º Leitura de
mesa de texto dramatúrgico ou exposição inicial da ideia da montagem para o
elenco.
3º Dinâmicas
introdutórias de curta duração (na maioria dos casos nem isso).
4º Decoração do
Texto e marcação de cenas.
5º Ensaios
gerais, geralmente três (concomitantemente a esta fase ocorre a produção de
cenários, execução de figurinos, concepção de luz, sonoplastia e maquiagem se
houver, etc).
6º Estreia.
Tal esquema apresentado ainda é
bastante otimista, pois em geral, a sistematização é bem mais modesta. Essa forma de vivenciar o ato
cênico, infelizmente, tem sido a tônica da construção histórica do teatro no
nosso estado e, os resultados verificados, mais que danosos, tornam-se
catastróficos, certamente, com raras e alvissareiras exceções.
A junção dos três elementos
referenciados: atuantes despreparados, diretores incompetentes ou Ideofrênicos e Processos Criativos Insuficientes refletem o que denomino “Fazer Por Fazer”, portanto, as
deficiências nos acabamentos dos
espetáculos produzidos no Piauí, apenas demonstram, acima de tudo, relações
éticas e valorativas questionáveis relacionadas ao universo profissional e
amador no âmago do Teatro Brasileiro de Expressão Piauiense.
Sem querer nos arvorar de donos da
verdade, valorizando a liberdade de criação que deve ser a insígnia do nosso
ofício, convicto da nossa falibilidade e limitações, porém, repletos do desejo
de contribuir com o conhecimento adquirido, através de imenso esforço e muita
humildade, para com o teatro como instituição milenar, cabe apontar soluções
plausíveis, para elucidação ou pelo menos minoração dos efeitos nocivos das teorias e práticas equivocadas reproduzidas
localmente pela nossa arte historicamente. Nessa perpectiva elaboramos os Diálogos de Pedagogia Teatral. Todavia, antes de mais nada, sugerimos aos
que comprometem seu tempo, talentos e suas próprias vidas a essa atividade
humana sem a certeza plena do que realizar, guiado por frágeis motivações, acompanhado
de exíguas condições e repletos de um sentido de dubiedade com relação ao
ofício, o Melhor, é Não Fazer Teatro!
Continua no 2º Diálogo
A Formação do Atuante Numa Perspectiva de Completude
Adriano Abreu
Diretor do Coletivo Piauhy Estúdio das
Artes
Estação da Seca
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