O Coletivo Piauhy Estúdio das Artes, Teresina-PI, pesquisa e desenvolve atividades em artes cênicas com foco principal na formação integral do atuante e suas interfaces com a arte do espetáculo.
quinta-feira, 27 de dezembro de 2012
AMOR, IMBATÍVEL AMOR
AMOR, IMBATÍVEL AMOR
O amor é substância criadora e mantenedora do Universo, constituído por
essência divina.
É um tesouro que, quanto mais se divide, mais se multiplica, e se
enriquece à medida que se reparte.
Mais se agiganta, na razão que mais se doa. Fixa-se com mais poder,
quanto mais se irradia.
Nunca perece, porque não se entibia nem se enfraquece, desde que sua
força reside no ato mesmo de doar-se, de tornar-se vida.
Assim como o ar é indispensável para a existência orgânica, o amor é o
oxigênio para a alma, sem o qual a mesma se enfraquece e perde o sentido de
viver
É imbatível, porque sempre triunfa sobre todas as vicissitudes e ciladas.
Quando aparente — de caráter sensualista, que busca apenas o prazer
imediato — se debilita e se envenena, ou se entorpece, dando lugar à
frustração.
Quando real, estruturado e maduro — que espera, estimula, renova —
não se satura, é sempre novo e ideal, harmônico, sem altibaixos emocionais.
Une as pessoas, porque reúne as almas, identifica-as no prazer geral da
fraternidade, alimenta o corpo e dulcifica o eu profundo.
O prazer legítimo decorre do amor pleno, gerador da felicidade, enquanto o
comum é devorador de energias e de formação angustiante.
O amor atravessa diferentes fases: o infantil, que tem caráter possessivo,
o juvenil, que se expressa pela insegurança, o maduro, pacificador, que se
entrega sem reservas e faz-se plenificador.
Há um período em que se expressa como compensação, na fase
intermediária entre a insegurança e a plenificação, quando dá e recebe,
procurando liberar-se da consciência de culpa.
O estado de prazer difere daquele de plenitude, em razão de o primeiro ser
fugaz, enquanto o segundo é permanente, mesmo que sob a injunção de
relativas aflições e problemas-desafios que podem e devem ser vencidos.
Somente o amor real consegue distingui-los e os pode unir quando se
apresentem esporádicos.
A ambição, a posse, a inquietação geradora de insegurança — ciúme,
incerteza, ansiedade afetiva, cobrança de carinhos e atenções —, a
necessidade de ser amado caracterizam o estágio do amor infantil, obsessivo,
dominador, que pensa exclusivamente em si antes que no ser amado.
A confiança, suave-doce e tranqüila, a alegria natural e sem alarde, a
exteriorização do bem que se pode e se deve executar, a compaixão dinâmica,
a não-posse, não-dependência, não-exigência, são benesses do amor pleno,
pacificador, imorredouro.
Mesmo que se modifiquem os quadros existenciais, que se alterem as
manifestações da afetividade do ser amado, o amor permanece libertador,
confiante, indestrutível.
Nunca se impõe, porque é espontâneo como a própria vida e irradia-se
mimetizando, contagiando de júbilos e de paz.
Expande-se como um perfume que impregna, agradável, suavemente,
porque não é agressivo nem embriagador ou apaixonado...
O amor não se apega, não sofre a falta, mas frui sempre, porque vive no
íntimo do ser e não das gratificações que o amado oferece.
O amor deve ser sempre o ponto de partida de todas as aspirações e a
etapa final de todos os anelos humanos.
O clímax do amor se encontra naquele sentimento que Jesus ofereceu à
Humanidade e prossegue doando, na Sua condição de Amante não amado
AMOR, IMBATÍVEL AMOR
DIVALDO PEREIRA FRANCO
DITADO PELO ESPÍRITO JOANNA DE ÃNGELIS
terça-feira, 11 de dezembro de 2012
Quando Atuar é Um Movimento da Alma
Quando Atuar é Um Movimento da Alma
“O palco é a
verdade, é aquilo que o artista acredita sinceramente;
até a mentira notória deve tornar-se verdade no teatro
para ser arte.
Para isso o
artista deve ter uma imaginação fortemente desenvolvida,
ingenuidade e confiança infantis, sensibilidade
artística
para a verdade e
o verossímil na sua alma e no seu corpo.
Todas essas propriedades lhe ajudam a transformar uma
grosseira
mentira cênica na verdade mais sutil da sua relação com
a vida imaginada.”
Constantin Stanislavski (Minha vida na Arte)
Nem eu, nem o mais hábil diretor de
teatro, é capaz de ensinar o mais talentoso(a) ator(iz) a representar um papel.
Essa é a consequente e mais profunda reflexão que realizo nos meus vividos anos
de teatro. “As mais terríveis verdades são os nossos melhores álibis”, preconiza
assim o grande Eugênio Barba, dessa máxima posso retirar lições que me libertam
e, traçam indeléveis metáforas, que me levam há outro tempo, outra dimensão do
significado atuar.
Sem gloriar-me de tal privilégio (até
com certo pânico), colaboro, de maneira pálida, com alguns dos melhores
intérpretes do teatro da minha aldeia-nação, o Piauhy. Convivendo com essas
mentalidades e espíritos ricamente complexos percebo, sem medo de errar, mas
ainda longe de uma verdade confiável, que os grandes atores e atrizes
movimentam suas almas, em chamas, na direção de um objetivo indecifrável,
intangível.
Deus criou homens e mulheres a sua
imagem e semelhança deu, ou retirou desses seres algo enigmático, os tornando,
ao mesmo tempo, vítimas e algozes do resto da humanidade, como também, de si
mesmos. Atuar, viverem muitas vidas em uma só existência de forma autêntica,
parece tarefa insondável para a maioria de nós outros, para eles ofício.
Como diretor, considero-me como um
tradutor de linguagens obscuras, para quem se propõe a tarefa teatral. Às
vezes, ajo como anjo protetor, outras vezes, como cruel escarnecedor. Não me
julguem mal, por favor, não cometam tamanha injustiça. O encenador que não
protege com verdades a quem dirige é um covarde e comete o mais nefasto dos
crimes para a arte dramática: a mentira.
Alguns, desses seres, que tenho a
honra de acompanhar, como quem compõe um poema inacabado, caminham a altiplanos
artísticos e humanos com a tranquilidade de quem recuperou definitivamente suas asas cortadas.
Outros ainda debatem-se na dúvida de todos os santos antes de provar a definitiva
comunhão com o eterno. Alguns se afundam no pântano da vaidade ilusória.
Nenhuma, ou pouca responsabilidade, tenho sobre isso, eles e elas, atores e
atrizes, são a arte, eu apenas um olhar. Minha função será cumprida com o que
me cabe na vida da cena, olha-los e dizer: “- Acreditei ou não acreditei em
vocês nessa noite.”
Para atriz Silmara Silva
(e para todas as nobres mulheres do Teatro)
domingo, 11 de novembro de 2012
Lamúrias de um rio que
tem a certeza de não mais chegar ao Oceano
Esta é uma
obra, que traduz a agonia de um rio chamado Parnaíba. Um rio que surgiu no meio
do sertão do Brasil e foi aos poucos se embrenhando pelas matas, rasteiro como
uma serpente, abrindo caminhos para chegar ao oceano, orgulhoso e com o
sentimento de um desbravador que cumpre a sua missão, um rio perene pai de
outros rios e que tem como fardo suportar o desrespeito e a fúria insana da
população ribeirinha da qual deposita como recompensa todos seus dejetos
produzidos.
“Lamúrias de um
rio que tem a certeza de não mais chegar ao oceano”, retrata essa trajetória,
como um grito de alerta. Uma instalação que nos faz refletir sobre a condição
social que afligem nossas águas, nos fazendo questionamentos e nos dando a
certeza de nossa própria covardia da nossa capacidade de não querer entender o
que está acontecendo.
Para
concretizar esse pensamento, e transformá-lo em obra de arte, me apropriei do
elemento rio, tendo como foco os esgotos que são despejados em suas costas como
se fossem nosso próprio vômito. Esta instalação mantém uma poética visual sem
grande impactos, mas ao mesmo tempo
provocante, pois utilizo matérias leves como a cerâmica em cilindro e a
parafina incolor, uma alusão a lágrimas, esgotos que choram a morte lenta dos
rios. Os cilindros de cerâmica ficam dispostos na parede como se fossem esgotos
e a parafina derretida representa líquidos venenosos que descem como uma
cachoeira congelada em forma de lágrimas.
Lamúrias, são prantos
e a tradução dos sentimentos de um rio,
o desdobramento de outras obras que fazem parte da minha trajetória como
artista engajado em defender as questões ligadas ao meio-ambiente.
quinta-feira, 9 de agosto de 2012
Relações Íntimas com o Teatro
Relações Íntimas no Teatro
“Metáforas são perigosas.
O amor começa com uma metáfora...”
Milan Kundera
Tempo de relações flúidas, hedonistas
e exibicionismo. Onde as pessoas até se fodem (foder significa também não dar
importância), mas não se amam e nem sequer se comem (comer pressupõe
alimentar-se) perambulam pelos caminhos, vazias. Nossas Relações Íntimas com o Teatro seguem a mesma lógica.
Falava, sempre falo o que não devo,
para um ator angustiado prestes a decolar para uma apresentação: “- Paz! O
sucesso vem atrás.” Ele sorriu entredentes e respondeu: “- É o que estou precisando.” O quê dizer sem parecer
arrogante e pretensioso? “ – Você irmão está pisando com suas botas em seu
próprio pescoço.” Não falei nada, ainda bem.
Consumar o ato amoroso com o teatro, como um bom amante, traduz-se em
plenitude. Embebidos no instante do fazer artístico, movidos pelo prazer
compartilhado e sublimes sensações nos transportamos para um universo paralelo divino,
sem axiomas ou meias verdades. Nós artistas sabemos tudo sobre meias verdades.
Culpas, mágoas, medos, muitas vezes
nos tornam impotentes para amalgamarmo-nos com o teatro. Egoísmo, tolas
vaidades, ilusões românticas de fama (o
sucesso é sempre um deus egoísta), racionalismos piegas apenas transformam nossas ligações intimas com a arte em atos
robóticos e, consequentemente, frustrantes. Orgasmos sem afetos são bolhas de
sabão. Todas as ilusões se esvaem como a neblina ao chegar dos primeiros raios de sol. Por que construir escadas
para o vazio interior? Construamos pontes para luz. Conhecer e entregar-se.
(Re)Descobrir amorosa e intensamente “a dimensão orgânica do gozo” teatral. Do ritual.
Ser feliz com minhas opções estéticas,
desejando e fazendo sempre o melhor, o bem feito. Existir e fazer com que o
outro exista na vida e na cena. Albert Camus
traduz o sentimento do precário em frase : “O homem é a única criatura que
se recusa a ser o que ele é.”
Amar e ser amado na e pela arte, o
que mais um artista pode querer? Exige autenticidade e desprendimento. Os
grandes e pequenos momentos tomarão conta do resto. O sentimento é tudo Aliás,
nada mais demodê do que relações íntimas casuais. O teatro é um amante fiel, saboroso, sobretudo, exigente. Sólido como uma
nuvem e líquido como um diamante.
(Este ensaio dedico a atriz Edite
Rosa singela e equânime como uma legítima Rainha Nagô)
Adriano Abreu
É Diretor do Piauhy:
Estúdio das Artes.
quinta-feira, 12 de julho de 2012
A História do Cavalinho de Pau
Conta à história que a atriz preocupadíssima que sua atuação fosse eivada de sucesso e brilhantismo propôs ao Diretor ou Encenador, esta segunda denominação está sendo largamente utilizada na contemporaneidade, em virtude disso existem explicações teoricamente tão complexas sobre as diferenças entre os dois termos que não vale a pena discutir neste texto, mas vamos ao diálogo:
Atriz - (convicta) Nesta cena eu vou entrar com um cavalinho de pau.
Diretor – (irritadíssimo) Não! Você não vai colocar o seu cavalinho de pau na minha cena.
A partir do final do século dezenove e durante todo século vinte o Diretor Teatral tornou-se a figura absoluta do espetáculo E. G Craig afirmava que o melhor ator seria uma de marionete turbinada ( Über marionete), afirmava com muita tranqüilidade: "Seu objetivo não é se tornar um ator célebre, mas um artista de teatro... Se após cinco anos de palco você tiver sucesso, considere-se perdido. É preciso dedicar a vida inteira à arte." Parece impossível acreditar mas poucos Grupos, Companhias ou Laboratórios teatrais perseveraram nos últimos cem anos sem essas “magnânimas” figuras; os "Mestres de Cena."
Na realidade o Encenador de magnânimo tem muito pouco, em geral, a conduta dessas vedetes da arte dramática, às vezes, é despótica. Eles decidem como será a montagem, distribuem as funções, espinafram o elenco, etc. Diplomata e general do coletivo elaboram estratégias e táticas de guerra na luta histórica que o teatro trava pela sua sobrevivência.
Único detentor da tradução exata da linguagem empregada pelo grupo no espetáculo, o diretor tornou-se, em muitos casos, a prima-dona do teatro.
Os tiranizados (atores e atrizes) apóiam e, em alguns casos, pagariam para viver sob o julgo desses suseranos. C. Stanislavisk afirmava: “ Se o teatro não puder enobrecê-lo abandone-o”. E frisava: “Não ponha seus pés sujos de lama no teatro”. B. Brecht montava a mesma cena durante dias de centenas de jeitos diferentes e ao final saia dos ensaios profundamente insatisfeito com seus atores. J. Grotowski submetia seus interpretes a uma disciplina tão rígida que os levava, após horas seguidas de treinamento ininterrupto, a um estado de super excitação psicofísica-emocional , ideal segundo sua concepção, a criação. E. Barba, no começo do Odin, demorava quatro anos para montar um espetáculo com atores e atrizes vivendo quase que totalmente reclusos. Quem do teatro não se submeteria a tão maravilhosas “ditaduras” para alcançar resultados artísticos tão surpreendentes?
Existe uma lenda que um ator dirigido por J.C Martinez ingenuamente pergunta ao Diretor: “- Onde devo me posicionar nesta cena Zé Celso”. O cérebro que criou o "Oficina" estranhando aquela presença responde: “- Quem é você?" O ator completamente aturdido: “- Sou o fulano. Já estou trabalhando a mais de um ano com você...” E Martinez friamente encerra a conversa: “- Pois fique daquele lado.”
Grandes encenadores tornam-se figuras míticas. Dizem que um ator liga quase sem voz para criador do CPT Antunes Filho: “-Antunes estou muito doente com quase 40 de febre não tem como ir ensaiar.” Antunes responde secamente e bate o telefone: “- Por acaso você já morreu.” Se tais histórias são verdadeiras ou mera ficção não importa, elas ilustram o poder e o caráter dos "Mestres da Cena."
Diretores de Teatro, geralmente, entram para arte pela porta larga dos atores e, independentemente dos seus êxitos como intérpretes, trazem características peculiares: são absolutamente alucinados por tudo que diz respeito as artes em geral e as cênicas em específico, disciplinados, possuem espírito investigativo, muitos são leitores compulsivos, escrevem eventualmente, tem um certo dom de liderança, rapidez nas respostas e trazem um olhar diferenciado sobre as coisas do mundo, São seres "filosóficos" mesmo. Quem não traz esses traços de caráter dificilmente será um bom Encenador.
No final do século vinte e início do século vinte e um surge (definitivamente) uma outra criatura que disputa, em muitos casos, a soberania do Diretor Teatral, trata-se do Produtor Cultural, esse personagem não ambiciona o estrelato, nem se preocupa com os grandes dilemas do teatro mas, é o único, que em cem anos ameaça o poder absolutista do Encenadores. Eles tem a força de conseguir a grana que constrói sonhos. São invisíveis a olho nu e essenciais aos coletivos. O impacto dos Produtores na arte dramática só o tempo dirá. Afinal, “O valor das coisas muda a luz do espiritual ou nas trevas do material”.
Com relação a história do cavalinho de pau? A atriz teimou e entrou com ele em cena. Até onde eu sei, ela e o Diretor nunca mais trabalharam juntos, desde esse fatídico dia. Faltou habilidade por parte da atriz em "camuflar" (ou negociar) a sua subversão e ao Encenador paciência para explicar que naquele momento, ao enxegar o todo do espetáculo, comprovou que era melhor o cavalinho ficar no estábulo dos signos imprestáveis, pelo menos até uma outra aventura.
Adriano Abreu
Diretor do Piauhy Estúdio das Artes
terça-feira, 10 de julho de 2012
O Problema da Arte do (a)
Ator (iz)
O que fazer? Os (as) atores (izes)
entram em furiosa rota de colisão com muros de condições adversas que
contradizem seus sonhos e reais necessidades.
Penso. Pensar sem agir, assim como, agir
sem pensar são sempre delírios, por isso ajo agora, escrevinhando, quem se
dedica a este tipo de atividade, nesse rincão nordestino, corre dois riscos
fundamentais: primeiro, tornar-se produto descartável e funcional de um mercado
que o enxerga como mão de obra barata, desqualificada, completamente desprovida
de qualquer valor intrínseco. Segundo e mais cruel problema, ser corrompido,
recluso, sujeitável por seres que usam a arte apenas como mero aparelho auto-projecional, devido a uma visão de mundo desprovida de objetivos nobres.
Tentarei não tornar este artigo improfícuo, tendo em vista que a questão
carece de respostas urgentes. Na arte, como na vida, verdades plenas são
gaivotas em alto mar, raridades.
Creio. Crer sem fazer, assim como, fazer sem crer são desvarios, por isso
faço agora, revelando. Homens e mulheres que participam de ações cênicas na
província de "São José do Piauhy" sofrem de uma profunda crise paradigmática (isso
vale para grande maioria dos artistas de todas as artes). Portanto, novos
modelos devem vir à luz. As velhas mentiras infiltraram-se como verdades
incontestáveis nas nossas cabeças e, os sofismas, que a grande irmãzinha
internet e a mãezinha televisão, gentilmente nos deram, talvez careçam de
análise mais acurada: a profissão de ator (iz) é uma atividade como qualquer
outra, só que mais exigida, a fama, o glamour, que os aparatos midiáticos
propagam como padrões inquestionáveis fazem parte de estratégias ideológica - comerciais,
visam unicamente o lucro e a alienação, desgraçadamente, essas verdades tem servido
de paradigmas para grande (bota grande nisso) maioria dos atores e atrizes
piauienses.
Pensem nos neurocirurgiões, juízes de direito, pilotos de caças,
profissionais altissimamente qualificados, importantíssimos para as sociedades
e nações qual o glamour que existe nessas atividades humanas? Por isso deixam
de ser essenciais? O oficio de ator (iz), só tem sentindo se trouxer a marca da
essencialidade para raça humana, caso contrário não passa de exibicionismo
piegas. O glamour está em ser bom no que se faz.
Quem foi que nos ensinou que atores (izes) não necessitam de estudo
sistemáticos e continuados, por toda sua existência? Já nos perguntamos por que
afirmamos tal disparate? “– Qual é! Ninguém faz minha cabeça, sou inteligente e
descolado, frequento as altas rodas.” Falarão os incautos.
Não sejamos tão ingênuos, somos frutos de construções sócio-culturais, não estamos, nem de longe, livre de influências, aliás, somos puro produto de
influências várias. Quanto ao estudo? Para realizar-mos obras de artes autênticas
teremos que ter a perícia de um neurocirurgião, o discernimento intelectual de
um juiz e a técnica perfeita de um piloto de caça. Perguntem a qualquer um
desses profissionais quantas horas por dia estudam? Dirão alguns: “– Mais nós
somos artistas.” Têm razão! Ser ator (iz) é de fato mais difícil, precisamos
estudar mais que eles. Isso inclui ensaios, estudos bibliográficos, consumir
arte de boa qualidade, escrever, apresentar e principalmente refletir sobre
tudo isso. Os artistas da Wuppertal (Companhia da Pina Bausch) faziam isso de 8h da manhã às 22h, os
atores do Odin (grupo do Eugenio Barba), trabalharam 14h por dia durante quatro
anos para montarem seu primeiro espetáculo, o Galpão montou o Cerejau, em
quatro semanas, intensivamente, depois de décadas apurando diuturnamente sua
técnica de atuação.
Artistas, não acreditemos
que a vida é uma eterna festa, assimilamos um padrão comportamental midiático,
com relação até o nosso lazer e o nosso prazer. Temos o direito ao prazer e
divertimento como todo cidadão (ã) normal. Porém, o artista da cena, que preza
por seu aparelho psicofísico-espiritual, não pode e não deve desgastar-se de
segunda a domingo em alegrias etílicas. O sono, atividade física orientada,
acompanhamento terapêutico regular, devem ser rotinas no cotidiano do ator (iz)
devido às peculiaridades desse trabalho. O sexo do artista é vendido nas redes
sociais, na TV, na mídia impressa como objeto de consumo. A sexualidade do ator
(iz) deve ser motivo de zelo, devido à intensa troca sensório-emocional das
relações. Deve ser tratado como consequência da busca de plenitude.
Nós artistas, em virtude das
programações que assimilamos, nutrimos desejo obsessivo pelo reconhecimento.
Cuidado! Os que não conseguem se libertar desse sentimento, podem se tornar
indivíduos nocivos á arte: profundamente fúteis materialistas, contumazes
ultrassensíveis a crítica, vaidosos, arrogantes, com o correr dos anos
preguiçosos e maldosos. O reconhecimento pode ou não acontecer. Vale á máxima:
“A arte é muito maior que o artista.” Muita gente mais talentosa e disciplinada
do que nós deram a vida por ela, sem obter nenhum reconhecimento. No sucesso e
no fracasso equanimidade.
Por fim, uma questão
absurdamente prática, a sobrevivência do (a) interprete. Muito provavelmente
você não ficará rico, nem comprará carros importados e mansões. Fará trabalhos
chatos e tolos, dará aulas, será dirigido por pessoas sem talento, será alvo da
inveja, incompreensão, maledicência, muitas vezes será enganado por criaturas
de má fé, trabalhará de graça e até pagará para fazer o que gosta. Mas sobreviverá
a troco de muito trabalho.
Conhecerá pessoas e lugares
interessantes, terá contato com o que de melhor e relevante o homem criou nas
artes e na cultura, se for realmente um ator (iz) autêntico (a). Poderá
inclusive, se tiver um pouco de cuidado aposentar-se e ainda continuar
trabalhando. Felizmente a sociedade regulamentou a profissão de ator (iz) garantido
alguns direitos básicos.
Se conseguires equilíbrio, poderá
constituir um lar, se interessar, ter filhos. Enfim ter uma vida normal, todavia,
muito mais rica do que a dos seus contemporâneos.
Coisas ainda precisam ser
ditas. Mas “O mistério da arte só nós temos o poder de desvendar e, é uma caminhada
árdua, porém possível.” Concluo com o poema de Paulo Leminski:
"isso de querer
ser exatamente aquilo
que a gente é
ainda vai
nos levar além"
Adriano Abreu – Diretor do Piauhy:
Estúdio das Artes
09/07/2012 às 22h de
Segunda-feira.
sábado, 9 de junho de 2012
Teatro que Cura, Teatro que Adoece.
Teatro que Cura
Teatro que Adoece
“Nenhum mal te sucederá,
Nem praga alguma chegará a tua tenda.”
Salmos 91:10
Este ensaio escrevo-o, para mim, e para o grupo que pertenço (Piauhy: estúdio das Artes). Todavia, creio que pode contribuir de forma humilde com outros artistas e comunidades de pessoas que se dedicam a arte de construir sonhos pelos palcos da vida. Para meu ser, Teatro, tornou-se tão essencial como a fé, o amor, oxigênio e proteínas. A poética teatral me serve de linimento, sem contra indicações, para os males do nosso tempo. Infelizmente, na proporção exata que existem teatros que curam, existem os que adoecem seus espectadores e construtores.
O velho Stanislavski, um dos santos seculares o Teatro, bradava pelas salas de ensaios e camarins: “- Não ponham seus pés sujos de lama no teatro”. Falava porque acreditava que o processo de construção e execução de uma obra de arte teatral era(e é) tão importante quanto seu resultado. Os grandes homens e mulheres das artes cênicas na contemporaneidade já acreditam nessa verdade. Tão precioso quanto o que o público vê é o que atores(izes), diretores(as) e técnicos vivem nos meses, por vezes anos, que antecedem a apresentação do produto cultural.
Numa sociedade depressiva, ansiosa, hedonista, profundamente egoísta, como manter os processos de construção de espetáculos a salvo das pragas epidêmicas do nosso meio? Impossível! Os grupos, coletivos e comunidades teatrais não podem ser encarcerados em bolhas de plásticos, imunes ao contágio de um mundo visivelmente doente. Esforço individual e conjunto fazem-se necessário no sentido de combater, ou pelo menos minimizar, os efeitos destrutivos das doenças emocionais e psicossociais que, não raro, atiram no monturo grandes perspectivas artísticas.
Vaidade desmedida, invejas internas e externas, maledicências estúpidas, estrelismo exacerbado (motivado por busca incontrolável de sucessos efêmeros), agressões gratuitas e fortuitas, são sintomas claros que “a lama” não foi retirada dos pés ao entrar-mos no Teatro. Emersom explicita: “- O que você grita tão alto em meus ouvidos que eu não posso ouvir o que você está dizendo”. Muitos coletivos e artistas não se reconhecem enfermos, aí não há solução possível, com o tempo, que tudo revela, os problemas aparecerão graves e irremediáveis, a doença se instalou no processo. Provavelmente, aquele trabalho construído com tanto esforço tende a desagregação.
Como manter a sinergia nos grupos artísticos? Devemos acreditar que o Teatro, como instituição milenar, é muito maior e mais importante do nós individualmente. Nomes e imagens carregadas de caráter personalista devem ser substituídos por nomes e imagens completamente identificados com aquilo que representam a arte de representar e suas inúmeras vertentes.
Diretores(ou encenadores) vaidosos geram grupos vaidosos, Diretores preguiçosos produzem grupos preguiçosos, líderes e grupos ingênuos sofrem com grupos obtusos. A lógica não se esvai. Mesmo em grupos onde a criação coletiva é muito presente e a liderança não explicitamente definida, urge um líder que democraticamente, mas sem passar mãos nas cabeças, controle ou expurgue os malefícios ocasionados durante a feitura do trabalho criativo em equipe. Essa figura, geralmente, é representada pelo Diretor. Ele é o referencial na grande maioria das comunidades cênicas. Portanto, apesar de sua importância não ser maior ou menor do que qualquer um dos envolvidos no processo deve ser ele o principal responsável pela saúde dos coletivos de criação.
Felizmente, mesmo em comunidades cênicas eivadas de pragas teatrais, é possível a criação de espetáculos de cura. Este continua sendo ainda um grande paradoxo e mais um milagre das artes cênicas.
Por espetáculos de cura compreendo aquele que indo de encontro à subjetividade do espectador consegue construis a possibilidade de reencontro com caminhos existenciais mais frutificadores. Trabalhos que fazem com que seu público (re)pense seus destinos ou, simplesmente, o faça sentir-se parte integrante da grande irmandade dos seres humanos, são espetáculos curativos.
Produtos culturais doentios no Teatro são facilmente identificáveis. O espectador defende-se, parte de uma posição de neutralidade para o escárnio barato ou vulgar com os que representam a peça (Deus meu, quantos vezes me surpreendo chamando o trabalho dos colegas de porcaria, quanta falta de visão). Após apresentação de um espetáculo que adoece a assistência traz na alma germes da desesperança, futilidade e até certa dose de perversidade.
Homens e mulheres de Teatro não há possibilidade real de amarmos coisas elevadas na nossa arte e ao mesmo tempo fazer concessões a estultices(assim na arte como na vida. Tudo é vida). Porém, é sempre bom lembrar que todos têm o direito de serem ouvidos, isso é ser profunda e belamente humano. Nossa arte deve (re)transformar-se em elemento de cura social e individual como foi na sua gênese.
Deixemos o Teatro que adoece, no processo e no produto, para os profundamente nugazes ou para os que por opção ou ignorância preferem as sombras da arte. Busquemos a cura.
Adriano Abreu
Final da estação das águas.
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