sábado, 11 de outubro de 2014

Sabemos Muito, Mas Não o Suficiente!



Sabemos Muito, Mas Não o Suficiente!

Este é o Teatro: um ritual vazio e ineficaz que enchemos
Com nossos “porquês”, com nossas necessidades pessoais.
Que em alguns países do nosso planeta é celebrado
na indiferença e que em outros pode custar a vida de quem faz.
Eugenio Barba

        A maturidade teatral tem me mostrado, que apesar de meus esforços, o quanto eu não sei nem nomear o que eu não sei, até essa frase cunhada não sabia até a pouco.
        O talentoso e insubordinado (por princípio) amigo Jean Pessoa falava com o olhar desesperançoso, daqueles que demonstram que alguma coisa ficou perdida pelo caminho, que não sabia de nada no teatro. Automaticamente repliquei: - Sabemos muito, mas não o suficiente! Essa descoberta revela o fim da ingenuidade e, se nos traz, uma dose cavalar de angustia, na minha opinião é indispensável a qualquer criador que se preze, nos libertando de pelo menos dois males extremos que afligem o nosso ofício: a indolente arrogância de algumas pessoas das gerações antigas que consideram que sabem de tudo, e o arriscado comportamento de muitos membros das novas gerações que acham que já sabem o bastante.
        Quando avidamente retornei à cena teatral, após uma quinquena de um exílio auto imposto dos palcos, mas não do teatro, deparei-me com novos e exuberantes artistas, cheios de fé e força, que realizavam suas reuniões de trabalho no tradicional Bar do João no Clube dos Diários, obviamente que os encontros eram regados a cervejas geladas e, os projetos imaginados, dificilmente, sairiam daquelas conversas para concretude. Na outra ponta da linha, as antigas “celebridades” da oblíqua Classe Teatral desfilavam na passarela das nefandas Instituições Públicas de Cultura, com seus saltos altos de supostas glórias do passado, à cata de editais culturais ou outras verbinhas (esmolas do poder público as cênicas), reconhecimento de alguém que estivesse disposto a elogiá-los e, até de “certos favores”, de algum jovem iniciante incauto, ambicionando projeção. Os “velhos companheiros” só não se preocuparam em repassar suas “valiosas” experiências, angariadas a duras penas, a troco de longos anos de batalhas de uma vida nos palcos, aos que vinham chegando, tão pouco, atentaram-se para a necessidade de renovar, constituir, manter e dar continuidade as suas tradições teatrais. O que eu encontrei quando retornei ao Teatro Brasileiro de Expressão Piauiense foi um cenário oscilante entre a ausência de algum futuro aceitável e um presente brutalmente fragmentado. Historicamente vivíamos o final da primeira década do século XXI.
         Na minha estúpida e intolerável vaidade considerava que podia alterar a ordem das coisas. Percebi, em um breve espaço de tempo, que não passava, também, de um idiota a mais da antiga geração querendo destilar, para os neófitos, conceitos que não dominava e valores não praticados para imberbes artistas, que não se interessavam por nada disso.  Existe uma máxima, retratada em canção, que diz que “mentir pra si mesmo é sempre a pior mentira”, atualmente, tenho visto, tantos “auto-mentirosos” nos palcos que já não sei “se rio ou morro”.
        Depois de cinco anos do retorno a vida teatral do estado e, de uma intensa atividade nessa área, posso afirmar que pouca coisa mudou mas, como dizia Heráclito, seiscentos anos antes da era Cristã: “-Não entramos duas vezes no mesmo rio.” Ao que Jorge Luis Borges complementa: “- Nem o rio é o mesmo e muito menos nós (não menos fluidos que o rio). Somente o ato inalienável da vivência na arte é capaz de transmitir aprendizagens, convicto de que se alguma virtude possuo, ela se chama vontade de aprender, e aprender sem compartilhar o aprendizado é a mais pura inocuidade. Portanto compartilho, humildemente, que tenho aprendido a respeitar o direito dos “novos” de serem e fazerem o que quiserem de suas vidas e visões artísticas, ao mesmo tempo, esse conhecimento me ensinou a exigir dos que querem conviver no teatro ao meu lado, compromissos crescentes, para que eles próprios sejam melhores naquilo que escolheram como trabalho e orientação existencial, caso contrário, os aconselho a procurarem outro caminho, pois ninguém é obrigado a fazer teatro.
           Hoje sei que os “velhos camaradas” das artes cênicas, apenas temem serem esquecidos, como outrora eu também temia. Temores são reflexos de nossa incapacidade de encarar o espelho da realidade e assumir que precisamos avançar.  
      Aprendi, entre outras coisas, que é melhor que alguns partam, para melhor oxigenação do trabalho coletivo. Liberando o teatro dos dúbios e farsantes a vida torna-se mais tranquila. Sobretudo, sei que não devo jamais dar as costas para o meu trabalho de diretor, para meus estudos e para realização das metas estabelecidas.
            A verdade sempre se impõe irresistível. Ela me diz que a ninguém cabe mudar os destinos do Teatro Brasileiro de Expressão Piauiense e dos homens e mulheres que o fazem, porém, tenho obrigação de operar mudanças em mim mesmo como individualidade artística, todavia, tudo isso ainda não é o suficiente, no entanto, como afirmava Kant: “-Sapere aude! – Ousai Saber!

Para o irreformável ator e poeta da cena Jean Pessoa.


Adriano Abreu
Diretor do Coletivo Piauhy Estúdio das Artes
Estação da Seca



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