sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

CONSTRUÇÃO (2016)

Foto: Adriano Abreu

CONSTRUÇÃO
(2016)
          Quantos caminhos um coletivo artístico pode trilhar? Quantas palavras, ações, silêncios e visões são necessárias para que ele perdure, produza, viva?
           Os refletores sobem e descem escadas, carregados por desconhecidos que se tornarão seus fiéis parceiros até o final do dia. As filas ora minúsculas, ora intermináveis nas portas das casas de espetáculos. As conversas nos bares, nas praças, no meio do mundo. Hotéis, casas transitórias e seus “mistérios”. O horário da comida, a comida, as fotografias, as vans lotadas e vazias, os bilhetes de passagens e as passagens não permitidas. Dinheiro e a falta dele. Concordâncias e os infinitos pormenores. A concretude do frágil, do efêmero, dos destinos cruzados.
            Todos os contatos construídos com olhares, abraços, mãos que se apertam. Considerações daquilo que foi afável, do grosseiro (elegâncias e desinteligências).
             A magia, a depressão, o medo e a coragem inaudita, a dor e a cura.
            Grupos, movimentos e espetáculos, alguns obtusos, muitos engajados e outros geniais.
             O pendulo eterno ensaio-erro-ensaio...
             A multidão de coisas visíveis e invisíveis também, constituem, a matéria e superfície onde se constroem uma organização teatral.
             Depois de alguns festivais internacionais (inclusive um fora do Brasil), muitas mostras e festivais locais e nacionais, 23 Edições do Ciclo de Leituras Dramáticas, coordenar a 5ª Edição do Núcleo de Laboratório Teatrais do Nordeste (idealizado pelo Oco Teatro Laboratório de Salvador-BA em parceria com o Festival de Teatro Lusófono do Grupo Harem de Teatro), um número considerável de exibições públicas dos nossos trabalhos (FOGO, Exercício Sobre Medeia e De Última Pocket Show), centenas de e-mails e todo tipo de mensagens, dezenas de artigos, comentários, debates, interlocuções, oficinas, entrevistas (sei lá quantas), incontáveis páginas lidas, ter visto um tempo incalculável de horas de espetáculos de todos os matizes, participado de intermináveis discussões dentro e fora do Coletivo Piauhy Estúdio das Artes, sempre convivendo com afagos, despedidas e pedidos de perdão que eu fiz e que me fizeram, nessa faina utópica, portanto digna e profética, de reinventar o Teatro Brasileiro de Expressão Piauiense, dessa forma, reinventando minha persona todos os dias a partir do amor e da luta dos meus irmão de caminho, agarrado a tudo isso e as minhas próprias asas. Chego a inexorável conclusão:
Estamos apenas começando!
Adriano Abreu em 30/12/2016

terça-feira, 30 de agosto de 2016

Por Que Fizemos? (Ensaio Minimalista Sobre a 5ª Edição do NORTEA – Núcleo de Laboratório Teatrais do Nordeste no FESTLUSO)

Foto: Margareth Leite

Por Que Fizemos?
(Ensaio Minimalista Sobre a  Edição do NORTEA – Núcleo de Laboratório Teatrais do Nordeste no FESTLUSO)
                                                                                                                                                                                                                                               “ postulado”
                                                                                                                                                          “fazer poemas é fácil
como amordaçar um lobo”
Paulo Machado

                                                                                                                                                                                     “parodiando postulado”
                                                                                                                                     “fazer teatro é fácil
retire a mordaça de um lobo”
Adriano Abreu


Fizemos porque há muito tempo a voz estava presa na garganta e, nossa boca, talvez por inabilidade ou imediatismo, estava exausta de falar.
Fizemos porque precisávamos ouvir algo muito parecido com a nossa voz. Aquele som rouco, quase imperceptível, vindo de um lugar qualquer dessa imensa nação usurpada.
Fizemos porque ansiávamos ver algo plasmado no corpo dos nossos irmãos, algo que vai muito além do teatro mas que faz parte dele, encarar face a face a cruel realidade da possível extinção do sonho do pão, do linho, do livro, da cena.
Nessa hora o impossível é não ser minimamente trágico.
Fizemos porque sentimos, por muito tempo, o odor do diletantismo que na maioria das vezes impregna os ares desse teatro do Piauí. Portanto, para que tudo faça sentido, devemos acreditar, como falava algum mestre: “O Teatro não é lugar para diletantes”.
O carinho e respeito que trago por vocês, meus irmãos da cena Piauiense, é equivalente a minha responsabilidade com o teatro, essa relação, muitas vezes conflitante, fez com que eu me esquecesse por um instante meu orgulho, medo, egoísmo e vaidade. Dessa forma procurei administrar minhas parcas forças e mínimas possibilidades na tentativa de realizarmos, de preferência juntos, uma ampla reforma na nossa casa teatral, e a (re)construção já está em curso.
Fizemos o 5º NORTEA dentro da Programação do FESTLUSO porque nossa pele, muito além dos inúmeros abraços que trocamos, necessitava roçar em outras experiências, dramaturgias, formatos e sensações. Precisávamos entender que a crítica pode ser uma forte aliada, nos retirando da zona de conforto, que ao invés de aquecer, nos atira no frio abismo da mediocridade.
Esse espaço-tempo onde habitamos fica livre para discordâncias, parcerias, olhares, quaisquer manifestações, exceto omissões; essa demência destruidora.
Antes do fim, é essencial que se reconheça a absoluta disponibilidade e abnegação ao Teatro de Expressão Nordestina, Brasileira, Lusófona e Mundial de algumas pessoas: Luís Alberto Alonso, Airton Martins, Francisco Pellé, Silmara Silva, Marcelo Flecha, Fernando Yamamoto, Pedro Vilela, Maneco Nascimento, Eraldo Maia, Rafael Magalhães, Antônio Marcelo, Aci Campelo, Chiquinho Pereira, Dionizio do Apodi, Josy Brito, Kil Abreu, conjunto dos diretores lusófonos e todos os membros de grupos, organizações, pesquisadores e equipe técnica do FESTLUSO.
Finalizando um frutífero começo: fizemos o 5º NORTEA no FESTLUSO, porque é fundamental e urgente (re)inventar o Teatro Brasileiro de Expressão Piauiense.  Nosso terrível ou venturoso futuro depende disso e de outras infinitas possibilidades.
Adriano Abreu
Diretor do Coletivo Piauhy Estúdio das Artes
30 de agosto de 2016


Por Que Fizemos? (Ensaio Minimalista Sobre a 5ª Edição do NORTEA – Núcleo de Laboratório Teatrais do Nordeste no FESTLUSO)



Por Que Fizemos?
(Ensaio Minimalista Sobre a  Edição do NORTEA – Núcleo de Laboratório Teatrais do Nordeste no FESTLUSO)
                                                                                                                                                                                                                                               “ postulado”
                                                                                                                                                                                       
 “fazer poemas é fácil
como amordaçar um lobo”
Paulo Machado

                                                                                                                                                                                     “parodiando postulado”
                                                                                                                                     
“fazer teatro é fácil
retire a mordaça de um lobo”
Adriano Abreu


Fizemos porque há muito tempo a voz estava presa na garganta e, nossa boca, talvez por inabilidade ou imediatismo, estava exausta de falar.
Fizemos porque precisávamos ouvir algo muito parecido com a nossa voz. Aquele som rouco, quase imperceptível, vindo de um lugar qualquer dessa imensa nação usurpada.
Fizemos porque ansiávamos ver algo plasmado no corpo dos nossos irmãos, algo que vai muito além do teatro mas que faz parte dele, encarar face a face a cruel realidade da possível extinção do sonho do pão, do linho, do livro, da cena.
Nessa hora o impossível é não ser minimamente trágico.
Fizemos porque sentimos, por muito tempo, o odor do diletantismo que na maioria das vezes impregna os ares desse teatro do Piauí. Portanto, para que tudo faça sentido, devemos acreditar, como falava algum mestre: “O Teatro não é lugar para diletantes”.
O carinho e respeito que trago por vocês, meus irmãos da cena Piauiense, é equivalente a minha responsabilidade com o teatro, essa relação, muitas vezes conflitante, fez com que eu me esquecesse por um instante meu orgulho, medo, egoísmo e vaidade. Dessa forma procurei administrar minhas parcas forças e mínimas possibilidades na tentativa de realizarmos, de preferência juntos, uma ampla reforma na nossa casa teatral, e a (re)construção já está em curso.
Fizemos o 5º NORTEA dentro da Programação do FESTLUSO porque nossa pele, muito além dos inúmeros abraços que trocamos, necessitava roçar em outras experiências, dramaturgias, formatos e sensações. Precisávamos entender que a crítica pode ser uma forte aliada, nos retirando da zona de conforto, que ao invés de aquecer, nos atira no frio abismo da mediocridade.
Esse espaço-tempo onde habitamos fica livre para discordâncias, parcerias, olhares, quaisquer manifestações, exceto omissões; essa demência destruidora.
Antes do fim, é essencial que se reconheça a absoluta disponibilidade e abnegação ao Teatro de Expressão Nordestina, Brasileira, Lusófona e Mundial de algumas pessoas: Luís Alberto Alonso, Airton Martins, Francisco Pellé, Silmara Silva, Marcelo Flecha, Fernando Yamamoto, Pedro Vilela, Maneco Nascimento, Eraldo Maia, Rafael Magalhães, Antônio Marcelo, Aci Campelo, Chiquinho Pereira, Dionizio do Apodi, Josy Brito, Kil Abreu, conjunto dos diretores lusófonos e todos os membros de grupos, organizações, pesquisadores e equipe técnica do FESTLUSO.
Finalizando um frutífero começo: fizemos o 5º NORTEA no FESTLUSO, porque é fundamental e urgente (re)inventar o Teatro Brasileiro de Expressão Piauiense.  Nosso terrível ou venturoso futuro depende disso e de outras infinitas possibilidades.
Adriano Abreu
Diretor do Coletivo Piauhy Estúdio das Artes
30 de agosto de 2016


quarta-feira, 8 de junho de 2016

Sobre Amigos, Arruaceiros, Medo e Chibatadas



Sobre Amigos, Arruaceiros, Medo e Chibatadas      
        
               “Meu trabalho não tem importância, nem a arquitetura tem importância pra mim.
                                                                                                                         Para mim o importante é a vida, a gente se abraçar, conhecer as pessoas,
                                                                                  haver solidariedade, pensar num mundo melhor, o resto é conversa fiada.”
Oscar Niemeyer

Sou amigo dos gays, trans e lésbicas que se assumem.
Os que não se libertaram ainda chutem as portas dos armários.
Não tenham medo de chibatadas.

Sou amigo dos que fumam maconha e apregoam revoluções.
Os que se enfurnam na escuridão, alegando ser este o motivo, esqueçam, em tudo há muita luz.
Não tenham medo de chibatadas.

Sou amigo dos negros, brancos, índios e pardos que caíram na brava luta.
Os que ainda residem nas senzalas da submissão, fujam pras quebradas.
Não tenham medo de chibatadas.

Sou amigo dos cristãos, dos ateus, dos budistas, dos islâmicos, dos magos e bruxas, dos caboclos e pombas giras e de todos os orixás, dos estoicos, mas também, dos epicuristas, estou junto dos promotores da paz do mundo.
Os que pregam o ódio e a destruição, acordem enquanto há tempo.
Não tenham medo das chibatadas.

Sou amigo dos artistas, doutores, ativistas, loucos, operários e camponeses.
Os que ainda temem a vida, venham, sejam bem-vindos, conheçam o sabor da amizade.
Não tenham medo dessas chibatadas, elas são, apenas, defesas daqueles que ignoram a vida que pulsa esparramada nas trincheiras da terra.

Do que mesmo que estávamos falando meu amigo?
Não, eu não tenho medo de chibatadas sou um arruaceiro, como estes, que teimam em pixar o mundo de verdades.
Sei que os artistas e os cães são os melhores amigos dos homens e mulheres...
Texto dedicado aos que veem a arquitetura
como a pluralidade de formas e expressões do mundo.
Adriano Abreu (Diretor de Teatro)

quinta-feira, 12 de maio de 2016

Recados aos Jovens Atores e Atrizes


Recados aos Jovens Atores e Atrizes


            Estão ingressando na carreira teatral? Gostaria de lembrar-lhes que, felizmente, o tempo nessa arte é medido por dedicação e compromisso, dessa forma 20, 30 ou 50 anos podem significar muitas coisas, inclusive nada. O fato é que vocês ingressaram em uma instituição que existe a cerca de 5000 anos e que, certamente, prescinde de qualquer um de nós para funcionar plenamente, ou seja, nós somos absolutamente dispensáveis. Portanto, avaliem com muita racionalidade suas motivações, se elas forem realmente nobres, continuem a fazer teatro, caso contrário, o abandonem sem olhar para trás.

            Desconfio que pretendem continuar nessa arte, então tenho algumas coisas a dizer-lhes, não são conselhos, pois o teatro não é “lugar de pregações’, são apenas recados que partem de constatações de um homem dedicado a cena, ainda muito imperfeito que luta contra sua própria ignorância. Contudo, estes “toques”, poderão ajuda-los, se quiserem. Caso contrário, podem contradizê-los, ou ainda, ignora-los:

- Existem pessoas maravilhosas na arte teatral, e vocês devem trabalhar com o maior número possível de artistas, porém, desgraçadamente, permanecem nela muitos vigaristas, doentes da alma e iludidos em grande proporção. Caso queiram dedicar sua vida a essa prática evolutiva, afastem-se dessas criaturas, saibam que elas habitam um vale de profundas trevas que não deverão adentrar.

- Desconfiem sempre de conquistas fáceis, dificilmente no teatro o fácil é sinônimo de bom. No entanto, busquem uma certa simplicidade nos seus atos cênicos, isso não significa que devam ser simplórios, quando falo em simplicidade penso em perfeição.

- Evitem se dedicar a conquista de elogios, 95% dos elogios que vocês receberão durante suas vidas na arte são meramente formais e acontecem em virtude da educação e bondade das pessoas. Tenham consciência que boa parte dos gracejos dedicados ao seu teatro, infelizmente, serão a forma mais covarde de traição que farão as suas pessoas, a chamada hipocrisia. Aprendam a diferenciar os sinceros elogios, os feitos por educação e os hipócritas. Artistas que se regozijam com elogios, em geral, são tremendamente obtusos.  

- Jamais se iludam com possíveis êxitos e nunca se desestimulem com os fracassos. Os êxitos passam muito rapidamente e os fracassos são lições que servirão para vida inteira.

- Estudem, pesquisem, conheçam, escutem, posicionem-se, experimentem, exercitem-se. O teatro não sobreviveu por milênios fundamentado em pessoas desinformadas, alienadas, ignorantes ou estupidas, alguns dos maiores gênios que a humanidade já produziu foram construídos na vida teatral. Construam suas cosmovisões.

- Cuidado com os excessos de vaidade. Conheço vários artistas, alguns até com um certo talento, que perderam completamente o senso da realidade por causa da tola vaidade. No teatro, essa característica nos homens e mulheres que o compõem, pode em muitos casos, ser traduzida como uma arte enfraquecida.

- O teatro não entrou nas vossas vidas para resolver todos os vossos problemas. Possivelmente, vão trazer-lhes alguns. Querem ganhar dinheiro com arte? Trabalhem muito, ainda assim, dificilmente ficarão ricos. Desejam o respeito da sociedade e das suas famílias? Imponham respeito através de um trabalho tão responsavelmente desconcertante que não terão mais coragem, pelo menos na sua frente, de os vilipendiarem. Pretendem serem amados? Amem-se.

- Compreendam as ações, consequências e transformações políticas do seu tempo num sentido amplo, sempre relacionando com a história da humanidade. O fenômeno teatral por si é um ato político, e as relações que vocês estabelecerem com seus contemporâneos, em virtude de suas práticas teatrais, definirão, como, e se os seus teatros permanecerão no tempo e no espaço. O excessivo isolamento ou a fragilidade de análise poderão deixá-los na inconveniente situação de serem, apenas, manipulados.

- Saibam escolher quais trabalhos devem executar. A grande maioria dos espetáculos e projetos são apenas joio. Para cada 100 trabalhos teatrais, no máximo, 1 ou 2 valem realmente a pena serem feitos. Porém, acreditem, nem sempre farão grandes espetáculos. Participar do que nem sempre nos agrada, infelizmente, faz parte de nossas carreiras, contudo, procurem tirar o melhor proveito possível de tudo que realizarem, inclusive das propostas ruins, que muitas vezes, por descuido ou necessidade, serão obrigados a aceitar.  

- Na nossa arte, disciplina é tudo, não faltarem a ensaios, não chegarem atrasados, decorarem textos nos prazos estipulados, trabalharem seus aparelhos psicofísicos, são as formas mais elementares de disciplina, todavia, bem poucos conseguem alcançar esse nível básico. Existem outras disciplinas que vão além das obrigações profissionais e, a mais sofisticada, entre todas elas, é enobrecer o caráter através da persistência.

              Desejo aos senhores e senhoras uma vida profícua na arte, porém, cabe ainda um último, e mais importante lembrete: “nas salas de ensaios, nos palcos e na vida digam sempre as suas verdades, nunca enganem ninguém e principalmente a si próprios. 


Adriano Abreu
Diretor do Coletivo Piauhy Estúdio das Artes

domingo, 24 de abril de 2016

Um Laboratório de Descobertas



Um Laboratório de Descobertas

“A essência do teatro que procuramos é pulsar, 
movimento e ritmo”. (J.Grotowski)


O universo o qual vivemos é cheio de muitas prerrogativas que nos levam a assumir determinados sacerdócios em busca da evolução humana e artística. E, assim os caminhos iniciam com uma incessante descoberta pela criação, o teatro, um mundo de todos e que apenas alguns tem coragem de enfrentar, dos Deuses aos Monstros Sagrados, eis aqui tu teatro, velejando entre tempestivas e mansas marés de todos os gritos alcançados. E com esse pensamento de eterna aprendiz, adentro para um mergulho cênico de dias, horas e segundos no Laboratório da Cena Clowns de Shakespeare, para fundamentar e internalizar meus preceitos e conceitos, afirmando: que o trabalho de grupo sobreviverá em quanto o teatro respirar todas as notas cênicas dessa melodia imortal.

O Laboratório da Cena Clowns de Shakespeare me proporcionou algumas lições importantes para o fazer teatral. Começo relatando o trabalho engajado de cada persona que ali contribuiu para o crescimento de cada atuante envolvido naquela imersão. Os Clowns possuem uma maestria tatuada na prática grupal, que reflete alguns anos de batalhas e ascensões visíveis. Esse compartilhamento generoso, gera um modo de pensar teatro, fazer teatro, como uma ciência do aprender e ensinar para abertura de um mundo novo, de ruptura de visões retrógadas e um porvir de potências transformadoras. Um único corpo dentro de um Barracão alicerçado de completude, de um orgulho viril, onde as quedas e levantadas são motivos de um acordar horizontal. 

Vivenciar umas das experiências mais interessantes nos últimos tempos, com profissionais a serviço da verdade, ir ao encontro de si mesmo, ao encontro do outro e de um coletivo para assim a magia transcender, me renovou as forças em um acreditar infinito. O teatro como um jogo a ser revelado, sendo energeticamente transbordados em cada exercício físico, vocal e mental. Confesso que foram dias de enfretamento, aceitação, lágrimas e superação. O aprendizado para a construção de si próprio, foi detalhadamente expelido no primeiro dia de Laboratório, onde os caminhos da percepção, escuta e entrega são partituras para um treinamento eterno. Ensinamentos para se propagar por fios na existência teatral. E na caminhada dos dias, me fizeram enxergar o teatro como um jogo e o atuante como jogador, nos seus exercícios dinamizados, abrindo alguns pontos convergentes, onde o jogo no teatro é a base fundamental da imaginação criadora. Estabelecendo tempo, espaço e relação, e acima de tudo ir em busca de um teatro vivo e que não mente em situação de representação. Na empreitada de construirmos conhecimentos, viajamos em um estudo de dramaturgia, onde a linguagem é um fenômeno complexo, um lugar de experiências para serem desbravadas. No ritmo frenético dos acontecimentos, atentamente nos deleitamos com uma aula de produção, a sustentabilidade, a ação e as estratégias de um grupo que não repousa. São realidades não muito distintas de outras sentidas por grupos de teatro por todo planeta. Subitamente o Laboratório da Cena, nos presenteia com uma aula magistral de iluminação. “Todo efeito de luz está na natureza”. Uma oportunidade singular, teorizar e praticar enquanto atriz um exercício de luz, e essa inter-relação, formando uma única composição. Elemento de linguagem que não deveria ser distante, mais está presente no estudo e pesquisa, mais que muitos atores não têm acesso, devido uma série de carências. Um olhar aguçado, uma destreza e delicadeza, foram essas luzes de um ser que disse: “Luz é aquilo que nos faz ver”. 

Como todo grupo, coletivo, companhia, tem um ponto de equilíbrio, nos Clowns de Shakespeare, tem uma poderosa rocha, a parte dinâmica daquele Barracão, que carrega as dores e alegrias em um tempo onde as adversidades são cruéis, mais suas camadas são mais firmes, para suportar a labuta teatral de todos os dias. O equilíbrio que harmoniza a árvore Clowns, desde suas raízes até as folhagens mais frágeis, é assim que espio um fruto chamado Yamamoto, que nos concebeu o conhecimento e o trabalho. Eu fico com as cores, cheiros, e verdades desses artistas, homens e mulheres de teatro, impregnados na minha escrita cênica. Minha gratidão e respeito! Que o teatro seja sempre luz. Asè!


Silmara Silva
Coletivo Piauhy Estúdio das Artes
Teresina – Piauí – Sertão
Abril / 2016




   

sábado, 16 de abril de 2016




O Reino da Bruta Deselegância

“O poeta não escapa a história,
inclusive quando a nega ou ignora...”
Octávio Paz (Signos em rotação, p.55)


           Costumo escrever sobre teatro, através dessa arte vejo a impotência dos humilhados, a gélida manipulação dos comandantes das fábricas da maldade, enxergo, sobretudo, o pavor da violência insólita das microscópicas atrocidades. Contemplo, nas entrelinhas, refinadas docilidades que a vida trás: o som alegre das asas de uma abelha, o gozo da gargalhada que só os bufões promovem, a suprema magia de uma bem tecida cena.

         Hoje, porém, nada tenho a declarar sobre a arte. A realidade que se impõe de forma grotesca sobre a nação, exige, uma visão cênica mais ampla que vai além dos limites do palco, uma carpintaria teatral mais complexa, como se o País fosse um tablado tosco, onde construímos a dramaturgia da intolerância, onde o desrespeito e a estupidez povoam a boca dos engravatados, mas também, do cidadão comum que se acredita politizado.

          Brasil dos parvos, que rosnam nos quatro cantos contra a ladroagem, esquecendo-se de suas pequenas e grandes corrupções. Terra de fanáticos e fanatizados, que desejam a morte dos filhos de Deus em virtude do livre direito de amar a quem melhor lhes aprouver. 
Nação onde a imprensa, a polícia, o Congresso Nacional, o Poder Judiciário, o Governo, as empresas públicas e privadas e até o povo é visto com desprezo e desconfiança.

          Quem são os inimigos? Quem são nossos heróis? Alguém pode apontar com relativo grau de segurança essas categorias? O que mais nos assusta é a descortesia e brutalidade reinantes. Já não se constroem pontes dialógicas, não se pavimentam mais estradas para o futuro, cada qual que engula, e não vomite, as crenças, valores e certezas dos seus concidadãos. 

          O que restará após a tempestade? O ódio e a angústia erguerão alguma vida em plenitude?

          Através das sombras desse tempo, além das agremiações partidárias, igrejas, siglas, estéticas, ideologias e objeções, algum ouvido deve escutar uma palavra, um olhar subirá a ladeira da época rude, postando-se no ápice de alguma elegância. O vir a ser depende disso, apesar dessa tremenda e infame falta de comunicação, sempre sobrará um momento para sentirmos um breve e suave toque de mãos.

           Através desse concreto que se avoluma, em qualquer lugar desse imenso projeto de Nação, profetas sopram sementes no deserto.

Adriano Abreu


Um dia antes do Brasil descer a ladeira mais uma vez...

quarta-feira, 16 de março de 2016

A Essência das Coisas Teatrais



A Essência das Coisas Teatrais

“Quanto aos senhores, meus amigos, está tudo bem,
é agradável ouvi-los, mas... Ficar sozinha num quarto de hotel
 e decorar as falas de uma personagem é muito melhor.”
Arcádina, em a Gaivota de Anton Tchekhov

Diante de tão violentas e urgentes demandas que assolam o Teatro Brasileiro de Expressão Piauiense e a triturante rotina de um professor da educação básica, que resolveu fazer teatro da forma mais responsável possível, uma pergunta explode na luta pela coerência: “qual é de fato a essência das coisas teatrais?
Enquanto, imponderadamente, troco essas palavras com o generoso leitor, cinco textos de dois talentosos autores dramáticos esperam, ansiosamente, para serem lidos no HD do computador, uma parte considerável do futuro da Dramaturgia Brasileira de Expressão Piauiense pode estar ali, esperando minha pálida opinião.  Na mesa de trabalho dois livros repousam, como a trocar confidencias, travando o seguinte diálogo:
- Liberdade e independência significam primeiro e mais do que qualquer coisa responsabilidade com sua própria existência.
- Esse moço é muito indisciplinado!
Jurij Aushitz e Jaques Copeau parecem rir da minha cara.
Minha companheira pede que eu a ajude a rascunhar um texto para encenação da pascoa de seus alunos de teatro de uma escola pública, enquanto eu me exaspero tentando resolver a difícil equação, 4 músicos + 5 atores + um estúdio musical, variáveis praticamente impossíveis de conciliar no mesmo tempo e espaço.
As salas de ensaios estão frias dos corpos dos atores do Coletivo Piauhy Estúdio das Artes, enquanto os microfones estão encharcados do nosso suor, simplesmente, porque decidimos que deveríamos fazer uma dionisíaca festa (De Última Pocket Show), por considerarmos que a cidade, o país e mundo estão taciturnos e que precisávamos, “botar as pessoas para sorrirem, cantarem e dançarem, serem felizes por alguns momentos”. Amorosamente resolvemos dizer para aqueles que tentam nos enquadrar, obrigatoriamente, como arautos de um absoluto rigor estético e profundidade existencial inquestionáveis, que curtimos demais tudo isso, porém essa é só uma pequena parte de nossas verdades, portanto, torna-se impraticável nos rotular, pois somos, apenas e unicamente, artistas, e esse tipo de gente, os artistas, são surpreendentes.
Qual é mesmo a essência da arte teatral? O Coletivo Piauhy Estúdio das Artes me observa atentamente, enquanto reflito sobre esta questão, e me sussurra entredentes: “- Meu amigo você precisa concluir três espetáculos, um deles nem iniciado o trabalho, e os outros dois em diferentes estágios de pesquisa. O Ciclo de Leituras Dramáticas está com uma edição atrasada e o Suplemento Cultural Cigarra completamente emperrado, tens 1 projeto para concluir dos 4 que tem obrigação de fazer, além disso, tens 2 espetáculos na geladeira. Contudo, siga em frente, eu posso esperar.” Eu respondo envergonhado: “- Você é o único que me entende patrão. ”
Talvez seja uma parte da verdadeira essência das coisas do teatro, quando ele lhe consome, e o único compromisso prioritariamente possível seja o universo teatral. Não existem lamúrias, nunca nos abraçamos com a tristeza, se surge o pânico, e até o desespero em algum instante, comuns na ânsia da vontade de cumprir as ações, podemos traduzir nossa sempre presente superação com uma só palavra, amor.
Amar o teatro é amar toda a humanidade, de maneira transparente e contraditoriamente enigmática, apesar desse paradoxo, unicamente nós, compreendemos a importância do que nos propomos a realizar na luta pela concretização da plenitude da vida, das nossas vidas e, consequentemente, contribuindo com a existência daqueles que nos servem de assistência.
Hoje nossa aldeia, Teresina, pode dizer com tranquilidade: “- Confiamos em vocês, meninos e meninas do Coletivo Piauhy Estúdio das Artes. As vezes nos chateamos convosco, porque em alguns momentos pegam pesado. Sabemos do real compromisso dessa troupe de artistas com nossa aldeia e com nosso povo, reconhecemos a vossa fé no futuro. ”
Eis a real essência do teatro, FÉ e ESPERANÇA que juntas geram compromisso, porém, existe uma luz que brilha mais que todas as outras, nessa busca por essencialidades,  e ela é eternamente o AMOR. Alguém, em um momento supremo de sabedoria, já escreveu uma carta sobre isso, ainda não aprendemos muito sobre ela, somos apenas crianças, construindo nossas fortalezas.

Dedico este texto aos autores Brasileiros de Expressão Piauiense, Roberto Muniz Dias e ao Eraldo Eudes Maia, que se encantou cidadão do Piauí. Obrigado aos dois pela fé, esperança e amor ao futuro dessa terra.

Adriano Abreu, Diretor do Coletivo Piauhy estúdio das Artes
 Teresina, Estação das Águas
2016