Quando Atuar é Um Movimento da Alma
“O palco é a
verdade, é aquilo que o artista acredita sinceramente;
até a mentira notória deve tornar-se verdade no teatro
para ser arte.
Para isso o
artista deve ter uma imaginação fortemente desenvolvida,
ingenuidade e confiança infantis, sensibilidade
artística
para a verdade e
o verossímil na sua alma e no seu corpo.
Todas essas propriedades lhe ajudam a transformar uma
grosseira
mentira cênica na verdade mais sutil da sua relação com
a vida imaginada.”
Constantin Stanislavski (Minha vida na Arte)
Nem eu, nem o mais hábil diretor de
teatro, é capaz de ensinar o mais talentoso(a) ator(iz) a representar um papel.
Essa é a consequente e mais profunda reflexão que realizo nos meus vividos anos
de teatro. “As mais terríveis verdades são os nossos melhores álibis”, preconiza
assim o grande Eugênio Barba, dessa máxima posso retirar lições que me libertam
e, traçam indeléveis metáforas, que me levam há outro tempo, outra dimensão do
significado atuar.
Sem gloriar-me de tal privilégio (até
com certo pânico), colaboro, de maneira pálida, com alguns dos melhores
intérpretes do teatro da minha aldeia-nação, o Piauhy. Convivendo com essas
mentalidades e espíritos ricamente complexos percebo, sem medo de errar, mas
ainda longe de uma verdade confiável, que os grandes atores e atrizes
movimentam suas almas, em chamas, na direção de um objetivo indecifrável,
intangível.
Deus criou homens e mulheres a sua
imagem e semelhança deu, ou retirou desses seres algo enigmático, os tornando,
ao mesmo tempo, vítimas e algozes do resto da humanidade, como também, de si
mesmos. Atuar, viverem muitas vidas em uma só existência de forma autêntica,
parece tarefa insondável para a maioria de nós outros, para eles ofício.
Como diretor, considero-me como um
tradutor de linguagens obscuras, para quem se propõe a tarefa teatral. Às
vezes, ajo como anjo protetor, outras vezes, como cruel escarnecedor. Não me
julguem mal, por favor, não cometam tamanha injustiça. O encenador que não
protege com verdades a quem dirige é um covarde e comete o mais nefasto dos
crimes para a arte dramática: a mentira.
Alguns, desses seres, que tenho a
honra de acompanhar, como quem compõe um poema inacabado, caminham a altiplanos
artísticos e humanos com a tranquilidade de quem recuperou definitivamente suas asas cortadas.
Outros ainda debatem-se na dúvida de todos os santos antes de provar a definitiva
comunhão com o eterno. Alguns se afundam no pântano da vaidade ilusória.
Nenhuma, ou pouca responsabilidade, tenho sobre isso, eles e elas, atores e
atrizes, são a arte, eu apenas um olhar. Minha função será cumprida com o que
me cabe na vida da cena, olha-los e dizer: “- Acreditei ou não acreditei em
vocês nessa noite.”
Para atriz Silmara Silva
(e para todas as nobres mulheres do Teatro)
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