A Essência das Coisas
Teatrais
“Quanto aos senhores, meus amigos, está tudo bem,
é agradável ouvi-los, mas... Ficar sozinha num quarto de
hotel
e decorar as
falas de uma personagem é muito melhor.”
Arcádina, em a Gaivota de Anton Tchekhov
Diante de tão violentas e urgentes demandas que assolam o
Teatro Brasileiro de Expressão Piauiense e a triturante rotina de um professor
da educação básica, que resolveu fazer teatro da forma mais responsável
possível, uma pergunta explode na luta pela coerência: “qual é de fato a
essência das coisas teatrais?
Enquanto, imponderadamente, troco essas palavras com o
generoso leitor, cinco textos de dois talentosos autores dramáticos esperam,
ansiosamente, para serem lidos no HD do computador, uma parte considerável do
futuro da Dramaturgia Brasileira de Expressão Piauiense pode estar ali,
esperando minha pálida opinião. Na mesa
de trabalho dois livros repousam, como a trocar confidencias, travando o
seguinte diálogo:
- Liberdade e
independência significam primeiro e mais do que qualquer coisa responsabilidade
com sua própria existência.
- Esse moço é muito
indisciplinado!
Jurij Aushitz e Jaques Copeau parecem rir da minha cara.
Minha companheira pede que eu a ajude a rascunhar um texto
para encenação da pascoa de seus alunos de teatro de uma escola pública,
enquanto eu me exaspero tentando resolver a difícil equação, 4 músicos + 5
atores + um estúdio musical, variáveis praticamente impossíveis de conciliar no
mesmo tempo e espaço.
As salas de ensaios estão frias dos corpos dos atores do
Coletivo Piauhy Estúdio das Artes, enquanto os microfones estão encharcados do
nosso suor, simplesmente, porque decidimos que deveríamos fazer uma dionisíaca
festa (De Última Pocket Show), por considerarmos que a cidade, o país e mundo
estão taciturnos e que precisávamos, “botar as pessoas para sorrirem, cantarem
e dançarem, serem felizes por alguns momentos”. Amorosamente resolvemos dizer
para aqueles que tentam nos enquadrar, obrigatoriamente, como arautos de um
absoluto rigor estético e profundidade existencial inquestionáveis, que
curtimos demais tudo isso, porém essa é só uma pequena parte de nossas
verdades, portanto, torna-se impraticável nos rotular, pois somos, apenas e
unicamente, artistas, e esse tipo de gente, os artistas, são surpreendentes.
Qual é mesmo a essência da arte teatral? O Coletivo Piauhy
Estúdio das Artes me observa atentamente, enquanto reflito sobre esta questão,
e me sussurra entredentes: “- Meu amigo você precisa concluir três espetáculos,
um deles nem iniciado o trabalho, e os outros dois em diferentes estágios de
pesquisa. O Ciclo de Leituras Dramáticas está com uma edição atrasada e o
Suplemento Cultural Cigarra completamente emperrado, tens 1 projeto para
concluir dos 4 que tem obrigação de fazer, além disso, tens 2 espetáculos na
geladeira. Contudo, siga em frente, eu posso esperar.” Eu respondo
envergonhado: “- Você é o único que me entende patrão. ”
Talvez seja uma parte da verdadeira essência das coisas do
teatro, quando ele lhe consome, e o único compromisso prioritariamente possível
seja o universo teatral. Não existem lamúrias, nunca nos abraçamos com a
tristeza, se surge o pânico, e até o desespero em algum instante, comuns na ânsia
da vontade de cumprir as ações, podemos traduzir nossa sempre presente
superação com uma só palavra, amor.
Amar o teatro é amar toda a humanidade, de maneira
transparente e contraditoriamente enigmática, apesar desse paradoxo, unicamente
nós, compreendemos a importância do que nos propomos a realizar na luta pela
concretização da plenitude da vida, das nossas vidas e, consequentemente,
contribuindo com a existência daqueles que nos servem de assistência.
Hoje nossa aldeia, Teresina, pode dizer com tranquilidade: “-
Confiamos em vocês, meninos e meninas do Coletivo Piauhy Estúdio das Artes. As
vezes nos chateamos convosco, porque em alguns momentos pegam pesado. Sabemos
do real compromisso dessa troupe de artistas com nossa aldeia e com nosso povo,
reconhecemos a vossa fé no futuro. ”
Eis a real essência do teatro, FÉ e ESPERANÇA que juntas
geram compromisso, porém, existe uma luz que brilha mais que todas as outras,
nessa busca por essencialidades, e ela é
eternamente o AMOR. Alguém, em um momento supremo de sabedoria, já escreveu uma
carta sobre isso, ainda não aprendemos muito sobre ela, somos apenas crianças,
construindo nossas fortalezas.
Dedico este texto aos
autores Brasileiros de Expressão Piauiense, Roberto Muniz Dias e ao Eraldo Eudes
Maia, que se encantou cidadão do Piauí. Obrigado aos dois pela fé, esperança e
amor ao futuro dessa terra.
Adriano Abreu, Diretor
do Coletivo Piauhy estúdio das Artes
Teresina, Estação das Águas
2016
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